Gestão de qualidade é técnica e política, mas só perdura quando vira cultura
Gestão educacional não se mede apenas em planos e indicadores. Mede-se na capacidade de transformar regras em cultura, técnica em sensibilidade, decisão em pertencimento. A pergunta que precisa nos guiar é verdadeiramente simples e, como diria o pensador francês Edgar Morin, por este motivo, complexa, ao mesmo tempo: como fazer com que boas práticas ultrapassem a fase de projeto e se consolidem como cultura institucional, nas redes de ensino?
A técnica é indispensável. É ela que organiza o planejamento, orienta os financiamentos, define metas e indicadores de monitoramento. Sem esse rigor, a política educacional perde rumo. Mas a técnica, sozinha, não garante mudança. A experiência mostra que decretos, normativas e fluxos burocráticos não chegam ao chão da escola se não forem acompanhados de escuta, empatia e reconhecimento dos sujeitos que dão vida à política. A sensibilidade é o que traduz a norma em sentido, o que permite que professores, gestores, estudantes e a sociedade se reconheçam naquilo que está sendo proposto.
Foi assim que, em diferentes momentos, reformas educacionais só prosperaram quando uniram competência técnica e atenção ao território. Não basta copiar modelos ou acumular boas práticas; é preciso criar condições para que cada comunidade escolar as compreenda, se aproprie delas e as ressignifique, de acordo com a sua realidade. Caso contrário, caímos no conhecido “efeito projeto”: iniciativas que florescem com entusiasmo, mas desaparecem, com a troca de gestores ou a mudança de prioridades.
Transformar práticas em cultura institucional significa convertê-las em rotina, parte do modo como a rede funciona, independentemente das pessoas ou governos. Esse processo não é automático: exige continuidade, formação de quadros, clareza de propósito e, sobretudo, equidade. Porque só há cultura institucional se todos participam, e não apenas alguns. O que atinge poucos pode até ser boa prática; o que alcança todos, de forma justa, é cultura.
Sustentar uma política, a longo prazo, implica equilibrar planejamento estratégico e construção coletiva de sentidos. Como lembrava o economista chileno Carlos Matus, todo plano precisa dialogar com a realidade e suas forças em movimento. E, como ensinava o geógrafo Milton Santos, o espaço não é dado, mas é tecido pelas relações sociais. A escola também é assim: só se transforma quando o que se propõe faz sentido para a vida das pessoas que dela participam.
Por isso, o caminho democrático é insubstituível. Conselhos de educação, fóruns permanentes, espaços de escuta e avaliação participativa não são ornamentos, mas, sim, os canais que garantem enraizamento das mudanças. Uma gestão sensível e técnica, ao mesmo tempo, investe na formação permanente, na criação de redes colaborativas, na valorização da experiência dos profissionais. Reconhece que a cultura institucional se alimenta tanto de políticas estáveis como da energia viva das comunidades escolares.
O futuro da gestão educacional não está em escolher entre a técnica ou a sensibilidade, mas em unir as duas dimensões. Só assim, cada boa prática pode florescer como cultura, cada decisão se transformar em pertencimento e cada escola se reconhecer como parte de um projeto democrático de país.